São umas saudades que não se sabem dizer. São umas saudades que ninguém entende se não tiver sentido exactamente essa emoção. A de pegar nas sapatilhas, raspá-las na rezina, senti-la em pedaços colar-nos ao chão (às vezes ficavam uns bocados gordos que não se desfaziam e faziam feridas nos pés, como quando andamos descalços e pisamos uma pedra) e depois era dançar. Dançar de uma maneira que só quando crescemos aprendemos a ver como era. Pareciam só exercícios, uns e outros, tantos e todos seguidos, era tudo sempre tão arrumado. As roupas iguais em todas, os anos a fazer mudar a cor do maillot. As sapatinhas a perder o elástico e a ganhar fitas. E depois as sapatilhas a perderem a leveza e a ganharem pontas que nos faziam subir até tocar o céu. Lembro-me da primeira vez que me pus em pontas. Disse: "estou tão alta! Mais alta do que quando se usam saltos!" É outra emoção. O chão nas pontas dos pés e as mãos no tecto. E somos tão pequeninas que ainda não sabemos dizer tudo. Mas depois, quando se deixa e não se volta, fica esse vazio. Essa saudade de dançar a tocar o chão e o tecto, essa saudade de rodar sobre mim própria, como se não tivesse peso, como se não fosse um corpo. Apenas como se fosse ar contra o ar, nos desvios do vento, nos sopros que uma música tocada ao piano deixava sempre fugir. Tenho TANTAS saudades dessa parte tão grande e tão inteira de mim. Oh Pipa, bora voltar? hoje em dia, quando oiço tocar um sino, um sino fino e pequenino, ainda me rebenta o coração a disparar de nervos. Esta sei que só tu entendes mesmo ;) É uma espécie de instinto de Pavlov que nunca mais foi embora. Tlim tlim tlim. Bora voltar? ;)
obrigada maria... completaste-me a frase! mesmo que ainda não consiga descrever nas palavras o que sinto em relação a esta parte. gostava tanto de voltar. mas sei que foi uma parte passada da minha vida, de mim pequenina e de mim a ser bailarina e a não ser mais nada, de mim ainda mais com a vida inteira pela frente, e sei que nada volta a ser como foi... e isso talvez seja o que mais custa! o sino tlim tlim tlim. a solidão e o peso do mundo nas costas de nós tão cuidadosamente rigorosas perfeitas. pânico pânico. tambem sinto essa coisa na barriga cada vez que oiço um sininho daqueles... lol era um medo diferente, que não voltei a ter em mais nada na vida.
2 comentários:
São umas saudades que não se sabem dizer. São umas saudades que ninguém entende se não tiver sentido exactamente essa emoção. A de pegar nas sapatilhas, raspá-las na rezina, senti-la em pedaços colar-nos ao chão (às vezes ficavam uns bocados gordos que não se desfaziam e faziam feridas nos pés, como quando andamos descalços e pisamos uma pedra) e depois era dançar. Dançar de uma maneira que só quando crescemos aprendemos a ver como era. Pareciam só exercícios, uns e outros, tantos e todos seguidos, era tudo sempre tão arrumado. As roupas iguais em todas, os anos a fazer mudar a cor do maillot. As sapatinhas a perder o elástico e a ganhar fitas. E depois as sapatilhas a perderem a leveza e a ganharem pontas que nos faziam subir até tocar o céu. Lembro-me da primeira vez que me pus em pontas. Disse: "estou tão alta! Mais alta do que quando se usam saltos!" É outra emoção. O chão nas pontas dos pés e as mãos no tecto. E somos tão pequeninas que ainda não sabemos dizer tudo. Mas depois, quando se deixa e não se volta, fica esse vazio. Essa saudade de dançar a tocar o chão e o tecto, essa saudade de rodar sobre mim própria, como se não tivesse peso, como se não fosse um corpo. Apenas como se fosse ar contra o ar, nos desvios do vento, nos sopros que uma música tocada ao piano deixava sempre fugir. Tenho TANTAS saudades dessa parte tão grande e tão inteira de mim. Oh Pipa, bora voltar? hoje em dia, quando oiço tocar um sino, um sino fino e pequenino, ainda me rebenta o coração a disparar de nervos. Esta sei que só tu entendes mesmo ;) É uma espécie de instinto de Pavlov que nunca mais foi embora. Tlim tlim tlim. Bora voltar? ;)
obrigada maria... completaste-me a frase! mesmo que ainda não consiga descrever nas palavras o que sinto em relação a esta parte.
gostava tanto de voltar. mas sei que foi uma parte passada da minha vida, de mim pequenina e de mim a ser bailarina e a não ser mais nada, de mim ainda mais com a vida inteira pela frente, e sei que nada volta a ser como foi... e isso talvez seja o que mais custa!
o sino tlim tlim tlim. a solidão e o peso do mundo nas costas de nós tão cuidadosamente rigorosas perfeitas. pânico pânico. tambem sinto essa coisa na barriga cada vez que oiço um sininho daqueles... lol era um medo diferente, que não voltei a ter em mais nada na vida.
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